Monday, August 27, 2012

 

27 de agosto de 2012 | N° 17174

BOM EXEMPLO

Estrada para o futuro

Em uma demonstração de como é possível buscar alternativas sustentáveis de transporte, dinamarqueses passeiam e pedalam até o trabalho em ciclovia de quase 18 quilômetros construída nos arredores de Copenhague

Imagine quase 18 quilômetros de uma ciclovia lisinha serpenteando pelo interior. Praticamente sem ser interrompida por estradas ou cruzamentos, ela passa por campos, quintais, pássaros gorjeando, um lago, alguns patos e, a cada 1,5 quilômetro, uma bomba de ar para encher os pneus.

Para alguns dinamarqueses, é assim que se vai e volta do trabalho.

Susan Nielsen, professora de 59 anos, era uma das primeiras pessoas a aproveitar a primeira superciclovia da Dinamarca numa manhã recente, quase no meio do caminho entre Copenhague e Albertslund, um subúrbio que é o ponto final da estrada.

– Estou muito contente por causa da melhor pavimentação – afirma Susan, de capa de chuva e levando um par extra de calças na mochila para vestir depois de 40 minutos de pedalada.

Inaugurada em abril, a superciclovia é a primeira das 26 rotas a serem construídas para incentivar mais as pessoas a irem e voltarem do trabalho de bicicleta em Copenhague. O projeto é fruto de urbanistas procurando formas de aumentar o uso de bicicletas em um lugar onde metade dos residentes já pedala todo dia para o trabalho ou a escola.

– Nós somos muito bons, mas queremos ficar melhores – diz o chefe do Departamento de Planejamento de Trânsito de Copenhague, Brian Hansen.

Ele e a equipe viram potencial nos trabalhadores suburbanos, a maioria dos quais se vale de automóveis ou do transporte público para chegar à capital.

Um ciclista típico utiliza a bicicleta por cinco quilômetros, explica Hansen, cujo escritório conta com um cabideiro de ponchos que os funcionários ciclistas podem usar em caso de chuva:

– Nossa dúvida era: como fazer as pessoas darem pedaladas mais longas?

Eles decidiram deixar as ciclovias com mais cara de autoestrada. Embora exista uma boa rede de ciclovias ao redor de Copenhague, as regras municipais podem ser inconsistentes, com trechos nos quais o pavimento, a iluminação ou a manutenção durante o inverno são inadequados, além de cruzamentos e aberturas inseguras.

– Não adianta ter uma ciclovia boa com um trecho no meio coberto de neve – sustenta Lise Borgstrom Henriksen, porta-voz da secretaria responsável pela superciclovia.

Para realizar o projeto, Copenhague e outras 21 cidades se uniram para garantir que houvesse rotas padronizadas e contíguas para a capital, em distâncias de até 22,5 quilômetros.

– Queremos que as pessoas percebam tais rotas como uma alternativa séria, como tomar o ônibus ou o trem, ou ir de carro – garante Hansen.

O plano recebeu um amplo apoio em um país cujos legisladores de direita e de esquerda costumam pedalar para o trabalho (ainda que em modelos de bicicleta levemente diferentes).

Enquanto pedala na primeira superciclovia, que fica mais cheia perto da capital, Marianne Bagge-Petersen relata estar a caminho de um grupo de apoio a pessoas em busca de emprego:

– Eu me sinto bem pedalando. Estou procurando emprego e, se não sair de casa, será um dia muito longo.

Moradora descobriu “ônibus de bicicleta”

A próxima superciclovia vai ligar Copenhague à cidade de Fureso, a noroeste do país. Nela, a ciclovia atual atravessa uma linda floresta que, infelizmente, é muito escura à noite.

Para obedecer aos padrões da ciclovia, Fureso já testou uma iluminação gerada por energia solar.

– As pessoas ficaram muito felizes com isso – afirma o líder do projeto climático do município, Lene Hartmann.

Há vários anos, uma moradora de Fureso, Karsten Hansen, deu início a um “ônibus de bicicleta”: os ciclistas viajam juntos, fazendo revezamento para bloquear o vento e facilitar a pedalada.

Hansen, que estima poupar pessoalmente uma tonelada de CO2 por ano, espera que a superciclovia incentive mais pessoas a pedalar as magrelas.

O prefeito de Fureso, Ole Bondo Christensen, também anseia pelas melhorias que a novidade trará. Christensen não tem carro e pedala diariamente mais de seis quilômetros para trabalhar:

– É minha forma de espairecer. Às vezes, tenho novas ideias.

Até o fim do verão no Hemisfério Norte, depois que o resto da iluminação alimentada por painéis solares for instalado, o trecho de Fureso da estrada estará pronto para virar superciclovia.

Projeto custou R$ 1,6 milhão

A Região da Capital da Dinamarca – responsável por hospitais públicos e pelo desenvolvimento regional – destinou US$ 1,6 milhão ao projeto da superciclovia.

– Quando pensamos em hospitais públicos, examinamos com atenção como reduzir os custos – diz um conselheiro regional, Lars Gaardhoj, que tinha acabado de pegar os três filhos pequenos numa bicicleta decorada com elefantes.

Na Dinamarca, graças a medidas como a superciclovia, os trabalhadores escolhem as bicicletas por serem um meio de transporte mais rápido e conveniente.

– A questão não é os dinamarqueses serem mais ligados à ecologia – avalia Gil Penalosa, diretor executivo da 8-80 Cities, organização canadense que atua para tornar as cidades mais saudáveis.

Para Lars Gemzo, sócio da Gehl Architects, dentro de Copenhague pedalar já era a melhor opção para muitos tipos de viagens. Estatísticas dinamarquesas apontam que a cada 9,7 quilômetros pedalados, existe uma economia de 1,6kg de emissões de dióxido de carbono e US$ 0,09 em custos de saúde pública. No entanto, muitos apontam a felicidade como um dos principais benefícios de ir ao trabalho de bicicleta.

– Após pedalar por 30 minutos, você passa a se sentir melhor – assegura o ministro dos Transportes, Henrik Dam Kristensen, que apoia as superciclovias.

O chefe de comunicação da Federação Dinamarquesa de Ciclistas, Frits Bredal, alertou que as superciclovias não eram perfeitas. Segundo ele, seria ideal não existirem sinais vermelhos, além de haver pavimento perfeito, sem buracos e obstáculos.

Diversas inovações ciclísticas estão sendo testadas em Copenhague. Algumas, como suportes para os pés e tecnologia “onda verde”, temporizando os semáforos na hora do rush para se adequar aos ciclistas, já estão funcionando na superciclovia. Outras, como latas de lixo inclinadas para facilitar o acesso e pistas para “conversação”, nas quais duas pessoas podem pedalar lado a lado e falar, poderão ser vistas em trajetos de longa distância no futuro.

Zero Hora, Caderno Nosso Mundo Sustentável, 27/08/2012

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