Sunday, August 10, 2014

 

A desigualdade segundo Piketty

10 de agosto de 2014 | N° 17886 Zero Hora 10/08/2014
ECONOMIA
A desigualdade segundo Piketty
Por que um denso tratado de economia de um jovem professor francês se tornou o best-seller mais discutido deste ano
O mundo é desigual. Uma parte dessa desigualdade é boa. É o que dá cor à vida e nos faz únicos e diferentes. Mas outra parte da desigualdade é ruim, quando representa um passado que impede o futuro de acontecer e nega oportunidades iguais às pessoas. Somos desiguais também em nossas opiniões sobre as desigualdades. Alguns de nós acreditam que as desigualdades de oportunidades (principalmente as econômicas) são um custo necessário para manter nossos sistemas produtivos lubrificados. Outros veem nessas desigualdades uma característica inaceitável de nossas sociedades. É muito difícil pensar de modo imparcial, distante de nossos interesses e preconceitos, sobre todos os tipos de desigualdade na sociedade, porque nossa razão é escrava de nossas reflexões fragmentadas, que são resultantes de uma amálgama de conhecimento intuitivo que acumulamos a partir de nossas experiências e circunstâncias pessoais.

Thomas Piketty, professor da Paris School of Economics, publicou este ano um “tour de force”, O Capital no Século XXI, sobre o papel da desigualdade de renda e de riqueza na configuração da estrutura social em que vivemos. Não se viu um livro de economia que tenha causado tamanho furor nesses últimos tempos. O prêmio Nobel Paul Krugman nomeou-o de “o mais importante da década”. Outro Nobel, Robert Solow, qualificou-o como “uma contribuição poderosa”. A revista inglesa The Economist chamou-o de “guia definitivo sobre a desigualdade”. Inúmeras resenhas foram escritas sobre o livro. Isso não significa que ele ficou isento de críticas (como a do jornal inglês Financial Times, que o criticou por suas séries históricas), muito pelo contrário; apenas ilustra o fato de que Piketty tocou o “dedo na ferida”, especialmente em um contexto pós-crise de 2008.

Segundo ele, devemos tentar entender, de modo sistemático e metódico, a desigualdade não apenas de renda (que é gerada ao longo de um ano) mas de riqueza (acumulada historicamente), pois encontramos na tensão entre essas duas linhas distributivas uma dinâmica de classes, de interesses e de mecanismos institucionais que impactam na constituição das estruturas sociais e no modo como a política se materializa em nossas vidas.

O método usado por Piketty é simples: primeiro, trata do marco teórico (no caso, centrado em duas leis fundamentais do capitalismo, que relacionam a desigualdade ao crescimento econômico e ao retorno do capital) e depois a busca por evidências (principalmente na história econômica da Europa e Estados Unidos, desde o século 18) que confirmem suas hipóteses. Nessa trajetória, ele procura mostrar que a desigualdade motivada pela reprodução da riqueza pela riqueza (principalmente do capital herdado que busca valorização na esfera financeira) está na origem dos problemas econômicos e políticos contemporâneos.

De fato, a desigualdade da distribuição da riqueza é bem maior do que a da renda. No mundo, os 10% no topo da distribuição da renda do trabalho recebem normalmente 25% a 30% da renda total, enquanto os 10% mais ricos na distribuição de riqueza têm sempre mais do que 50% do total. Apenas números? Não, segundo ele, pois estamos falando de uma luta intergeneracional que se sobrepõe à luta de classes e que pode afetar o próprio futuro do capitalismo.

Vejamos alguns outros números. Pensemos primeiro na renda. Se o salário médio nas sociedades mais iguais (como nos países Escandinavos) é de R$ 6 mil por mês, os 50% mais pobres ganham R$ 4,2 mil reais, os 10% mais ricos ganham R$ 12 mil e os 1% mais ricos ganham R$ 30 mil. Por outro lado nos países mais desiguais (como nos Estados Unidos), os 50% mais pobres ganham apenas R$ 3 mil, os 10% mais ricos ganham R$ 21 mil e os 1% mais ricos ganham R$ 72 mil. Essas diferenças são fundamentais no tipo de vida que as pessoas podem levar nessas sociedades, escondendo algumas vezes formas de discriminação de gênero ou de raça.

Quando passamos para a distribuição de riqueza, vemos uma concentração ainda maior. Na maior parte dos países europeus ricos, a riqueza média do cidadão é de R$ 600 mil por adulto. Como os 50% mais pobres nessas sociedades têm apenas 5% da riqueza, isso equivale a um patrimônio de R$ 60 mil. Por outro lado, os 10% mais ricos, que têm 60% de toda a riqueza, possuem patrimônio em média de R$ 3,6 milhões (em que os 9% mais ricos têm uma riqueza de R$ 2.4 milhões e o 1% mais rico ultrapassa os R$ 15 milhões). Interessante observar que os mais ricos entre os ricos não acumulam riqueza via ativos imobiliários, mas sim via ativos financeiros. No final, a riqueza é ainda bem mais concentrada do que a renda.

Em 1987, havia 140 bilionários no mundo, que juntos tinham US$ 300 bilhões de riqueza. Em 2013, tínhamos já 1,4 mil bilionários, que possuem US$ 5,4 trilhões, quase quadruplicando sua participação na riqueza privada do mundo no período.

Durante todo o livro, Piketty mostra certa incredulidade em como “os vencedores” da hierarquia social conseguem convencer “os perdedores”. Ele argumenta como a justificativa de que altos salários podem ser explicados por diferenciais de produtividade não possui embasamento empírico e chega perto, segundo ele, de “uma construção puramente ideológica”. Ele questiona ainda o significado de “classe média” e de como o poder econômico se reproduz socialmente.

Assim, se ele estiver certo, somos dominados – sim, dominados, diz ele – por 0.1% dos mais ricos no mundo que nos fazem acreditar, com base nas migalhas que nos deixam – sim, ‘migalhas’, ele usa essa palavra – que estamos muito bem como classe média e como pobres. Para ele a riqueza é tão concentrada que nós não temos nem ideia de como ela se reproduz.

Podemos, assim, viver “felizes”, em um mundo desigual, admirando aqueles que nos oprimem.

FLAVIO COMIM | PROFESSOR DO INSTITUTO DE ECONOMIA DA UFRGS

Wednesday, April 09, 2014

 

Estatísticas abusadas

MARIO CORSO - Zero Hora, 08/04/14


Esses tempos, vi uma camiseta com os dizeres: 95% de todas as estatísticas são inventadas, 70% das pessoas sabem disso. Essa piada é teste para nerd, se você riu, é um deles. Se não acha graça, bom, é piada nerd. Lembrei desse paradoxo jocoso, que faz uma afirmação na qual a negação é implícita, a propósito dos dois vexames da semana passada.


Primeiro, foi o Ipea que inverteu um resultado de pesquisa causando uma comoção. Ele nos fez acreditar que dois terços dos brasileiros concordam que as mulheres estupradas fazem por merecer, ou por estarem usando pouca roupa, ou de alguma forma sendo provocativas. Vexame dois: ninguém se tocou de que os números não batem com a realidade. Ao contrário, houve quem disse sentir isso na pele, e que os dados só confirmam sua intuição prévia.

E como fica agora, que é o oposto? Corrigidas as tabelas, sabemos que é um quarto dos brasileiros que pensa semelhante disparate. Embora o número ainda seja problemático, é desproporcional com o anterior quase na razão de três para um. Ou seja, segue sendo um resultado ruim, mas não tão absurdamente ruim como antes. Não é um número que nos faça parecer talibãs, é a realidade dura da América Latina machista. Como fica então a intuição? Ou só nos prova que a intuição pode ser o pântano dos nossos preconceitos, caminho para enganos?

Maldosamente, é o momento de lembrar das piadas sobre estatística, aquela ciência que diz que se eu comi um frango e meu vizinho nada, estatisticamente cada um de nós comeu a metade. Ou como se diz: ela é que nem biquíni, mostra tudo menos o essencial. Mas a questão não é a estatística, ela é só uma ferramenta. O que fica claro é que temos um fetiche com números. Eles, por si sós, parecem revestir os fatos de ciência anunciando uma verdade. As ciências sociais carecem do charme da certeza que a ciência dura diz ter. Quando alguém chega analisando a fluidez da nossa subjetividade com números e tabelas, tendemos a uma aceitação sem a salutar desconfiança.

Mas um erro pode nos mostrar uma verdade, nesse caso duas. A primeira é que a sensação de medo que o estupro move, e a bestialidade que seu ato encerra, nos remete a um pensamento superlativo. Talvez o aceite do exagero seja proporcional ao absurdo, tanto do ato como do pensamento que culpa a vítima.

Segundo, parece que a camada pensante não conhece bem a sociedade brasileira. Basta chegarem dados que falem mal de nós, que não só acreditamos, como emendamos outros impropérios sobre o nosso atraso e falência moral. Quando julgamos nosso país, somos dotados de um pessimismo trágico, tenazmente arraigado. Por alguma razão, nos apraz ver-nos piores do que somos. Já que estamos falando de abusos, não seria também um abuso pensar tão mal de nós mesmos?

Monday, March 03, 2014

 

Balcão de informações

"No outro dia me submeti ao suplício de buscar um balcão de informações. Uma senhorita de nariz empinado e profundo desprezo pela humanidade consertava o esmalte das unhas, folheava uma dessas revistas sobre ricos e famosos e, a intervalos, como se fizesse um favor ao universo, chamava o número de uma ficha. Logo percebi que me encontrava diante de uma legítima portadora do vírus da Sipa, ou, mais claramente, da Síndrome da Pequena Autoridade.


Conheço centenas de seus colegas. É fácil distingui-los. Basta verificar com que volúpia exercem seus mínimos poderes, com que ar de suprema importância e fingida intimidade atendem aos telefonemas de seus superiores, contam graças, riem de confidências tão verdadeiras quanto uma nota de três reais. É fantástico observar o prazer com que repreendem seus subordinados, ou, numa repartição pública, citam artigos, parágrafos e incisos de desconhecidas leis e decretos, só para provar que você não tem razão.

Deles é o reino, o poder e a glória, principalmente quando são chefes. Com que divina sensação de poder constatam um erro de soma ou de ortografia, com que sublime deleite transformam culpas triviais em desgraças siderais, com que concentrada atenção lançam olhos de lince para o livro-ponto. Não são raros os mestres da intriga, os a summa cum laude na arte da discórdia, os PhDs na cizânia, os promotores de culpas inexistentes. E não preciso dizer que são também imbatíveis nas técnicas da vingança.

Contra quem?

Isso para eles importa tanto quanto um dólar furado.

Das alturas em que se eleva sua imaginação, todos lá embaixo merecem imediato castigo, rápida, exemplar punição.

Falei no começo de uma senhorita de nariz empinado, que pintava as unhas, enquanto o comum dos mortais mendigava por dois segundos de sua atenção.

Pois essa digna representante da Síndrome da Pequena Autoridade dorme muito bem todas as noite e sonha com os anjos.

Já nós, os deserdados, nascemos para as filas, as longas esperas, as afrontas.

Quem nos mandou pensar que somos iguais à dama que se acredita íntima dos ricos e dos famosos?"

LIBERATO VIEIRA DA CUNHA  - Zero Hora de 03/03/2014


Tuesday, January 28, 2014

 

Quem planeja Porto Alegre?

QUEM PLANEJA PORTO ALEGRE?

Ou: De como o Instituto dos Arquitetos do Brasil, IAB, perdeu seu lugar no Conselho do Plano Diretor – CMDUA – de Porto Alegre para, por exemplo, o Sindicato dos Corretores de Imóveis do RS

Vinicius Galeazzi – eng. civil

A Capital do Rio Grande do Sul, com cerca de um milhão e quatrocentos mil habitantes, que porta em sua história a participação de reconhecidos arquitetos urbanistas que estudaram e propuseram o seu desenvolvimento, não tem mais uma SMP – Secretaria Municipal de Planejamento. O setor de planejamento, com a função de pensar a cidade, naquela falecida secretaria, foi diminuindo de tamanho e importância que, no início da atual gestão, virou um minguado setor na novíssima SMURB – Secretaria Municipal de Urbanismo.

A função de pensar a cidade e determinar seu desenvolvimento, está deixando de ter o seu fórum centrado no Município, enquanto sede de governo e de decisões, mas deslocado para um posto ainda indefinido que não prioriza o que o planejamento da cidade deve visar: o direito dos cidadãos de habitar, de locomover-se, de trabalhar, de formar-se e de divertir-se da melhor, mais abrangente e mais harmônica maneira possível. Enfim, a cidade que todos quereríamos. Prioriza outra coisa.

Vem de roldão, um conceito de cidade “intrépida”, que vai pondo abaixo a “romântica” cidade para os cidadãos. Faz erguer rapidamente grandes e fascinantes empreendimentos imobiliários, shoppings, viadutos e avenidas, empurrando as moradias para mais longe. Longe do trabalho, da escola, do lazer, exigindo esticar as linhas de ônibus, energia, água, recolhimento de lixo, longe da cidade fascinante. Mais triste e mais caro para o Município.

Mas, dirão, o Conselho do Plano Diretor – CMDUA - cumpre um papel importante de decidir as intervenções na cidade, os traçados das ruas e avenidas e os grandes empreendimentos imobiliários. E cumpre uma função democrática no processo de planejamento de Porto Alegre, pois é um colegiado bem representativo: além do secretário da SMURB, representantes eleitos das nove regiões da cidade, representantes de nove entidades governamentais e representantes de nove entidades que atuam na cidade. Neste último grupo que o IAB integrava o CMDUA desde 1955.

Este grupo é dividido em três subgrupos. Na eleição de novembro de 2013, havia no subgrupo do IAB, 25 entidades candidatas e eleitoras que deveriam escolher cinco representantes. Entre elas, a Sociedade de Engenharia do RS – SERGS -, o Sindicato dos Arquitetos do RS – SAERGS –,  o CREA-RS, o CAU-RS e o Sindicato dos Engenheiros do RS – SENGE-RS – que eu representava.

Fizemos uma breve articulação por telefone e na chegada à sala da eleição, entendendo que garantiríamos, pelo menos, dois representantes (IAB e SAERGS), quando víamos chegar à sala, com passo firme, outros representantes tranquilos, com o voto já decidido. Alguém lhes entregava uma cédula pronta. O coordenador da eleição fez uma breve e bonita preleção, explicando o processo eleitoral, finalizando com um “viva a democracia”. Solicitou que cada um dos presentes justificasse a importância de sua entidade fazer parte do Conselho. Lembro que o representante do Sindicato dos Transportes Pesados e Armados, ao final de sua fala, gritou também “E viva a democracia”.

O resultado da votação foi implacável. Os 16 votos batidos para as cinco entidades da cédula pronta garantiram-lhes as cinco vagas do subgrupo: a Associação Gaúcha dos Advogados do Direito Imobiliário e Empresarial (Agadie), o Sindicato dos Corretores de Imóveis do Rio Grande do Sul, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB/RS) e o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias da Construção Civil (STICC) e a Sociedade de Engenharia (SERGS). Esta última, a SERGS, teve 17 votos. Se entende, pois quando fui pedir para o representante do CREA apoio para o SENGE, este respondeu que estava lá para dar o voto tão somente para a SERGS.

A articulação com as 16 entidades funcionou. Ao passo que o IAB, SAERGS e SENGE receberam 6 a 7 votos.

Merece reflexão a composição do grupo da cédula. Merece, ainda mais, o resultado dessa votação. Será sinal dos tempos esse resultado? Que, com exceção do SERGS, associações de advogados imobiliários e corretores de imóveis garantam seu lugar no conselho que decide o planejamento e o urbanismo da cidade e o IAB, por exemplo, fique fora?

Duplamente, me parece. Dum lado, o Mercado, o mercado imobiliário e empresarial, assenta-se, articulado e organizado. De outro lado, as entidades que reúnem profissionais da arquitetura e da engenharia que, no passado, tiveram voz ativa e presente nas definições dos rumos da cidade, se encolhem, desarticuladas. Não ganham nada para isso, me justificou alguém. Noutros tempos também não ganhavam.

Se quisermos aprender alguma coisa com os fatos e reverter a situação, é preciso pensar na próxima eleição do DMDUA, a partir de hoje.

Paralelo a isso, se esvazia o setor de Planejamento do Município; onde estão os urbanistas que deveriam conhecer a fundo a história, a vocação, as prerrogativas da cidade para propor a cidade para seus cidadãos? Grandes projetos urbanísticos são encomendados de eminências de fora e os espaços públicos negociados. O mais evidente e simbólico sinal dos tempos é ver (e não vi isso nos lugares importantes de outras cidades no Brasil e fora daqui) nossos mais tradicionais e queridos espaços públicos, Teatro São Pedro, Largo Glênio Peres, Auditório Araújo Viana e daqui há pouco o nosso cais, crivados de Coca Cola.

Monday, August 27, 2012

 

27 de agosto de 2012 | N° 17174

BOM EXEMPLO

Estrada para o futuro

Em uma demonstração de como é possível buscar alternativas sustentáveis de transporte, dinamarqueses passeiam e pedalam até o trabalho em ciclovia de quase 18 quilômetros construída nos arredores de Copenhague

Imagine quase 18 quilômetros de uma ciclovia lisinha serpenteando pelo interior. Praticamente sem ser interrompida por estradas ou cruzamentos, ela passa por campos, quintais, pássaros gorjeando, um lago, alguns patos e, a cada 1,5 quilômetro, uma bomba de ar para encher os pneus.

Para alguns dinamarqueses, é assim que se vai e volta do trabalho.

Susan Nielsen, professora de 59 anos, era uma das primeiras pessoas a aproveitar a primeira superciclovia da Dinamarca numa manhã recente, quase no meio do caminho entre Copenhague e Albertslund, um subúrbio que é o ponto final da estrada.

– Estou muito contente por causa da melhor pavimentação – afirma Susan, de capa de chuva e levando um par extra de calças na mochila para vestir depois de 40 minutos de pedalada.

Inaugurada em abril, a superciclovia é a primeira das 26 rotas a serem construídas para incentivar mais as pessoas a irem e voltarem do trabalho de bicicleta em Copenhague. O projeto é fruto de urbanistas procurando formas de aumentar o uso de bicicletas em um lugar onde metade dos residentes já pedala todo dia para o trabalho ou a escola.

– Nós somos muito bons, mas queremos ficar melhores – diz o chefe do Departamento de Planejamento de Trânsito de Copenhague, Brian Hansen.

Ele e a equipe viram potencial nos trabalhadores suburbanos, a maioria dos quais se vale de automóveis ou do transporte público para chegar à capital.

Um ciclista típico utiliza a bicicleta por cinco quilômetros, explica Hansen, cujo escritório conta com um cabideiro de ponchos que os funcionários ciclistas podem usar em caso de chuva:

– Nossa dúvida era: como fazer as pessoas darem pedaladas mais longas?

Eles decidiram deixar as ciclovias com mais cara de autoestrada. Embora exista uma boa rede de ciclovias ao redor de Copenhague, as regras municipais podem ser inconsistentes, com trechos nos quais o pavimento, a iluminação ou a manutenção durante o inverno são inadequados, além de cruzamentos e aberturas inseguras.

– Não adianta ter uma ciclovia boa com um trecho no meio coberto de neve – sustenta Lise Borgstrom Henriksen, porta-voz da secretaria responsável pela superciclovia.

Para realizar o projeto, Copenhague e outras 21 cidades se uniram para garantir que houvesse rotas padronizadas e contíguas para a capital, em distâncias de até 22,5 quilômetros.

– Queremos que as pessoas percebam tais rotas como uma alternativa séria, como tomar o ônibus ou o trem, ou ir de carro – garante Hansen.

O plano recebeu um amplo apoio em um país cujos legisladores de direita e de esquerda costumam pedalar para o trabalho (ainda que em modelos de bicicleta levemente diferentes).

Enquanto pedala na primeira superciclovia, que fica mais cheia perto da capital, Marianne Bagge-Petersen relata estar a caminho de um grupo de apoio a pessoas em busca de emprego:

– Eu me sinto bem pedalando. Estou procurando emprego e, se não sair de casa, será um dia muito longo.

Moradora descobriu “ônibus de bicicleta”

A próxima superciclovia vai ligar Copenhague à cidade de Fureso, a noroeste do país. Nela, a ciclovia atual atravessa uma linda floresta que, infelizmente, é muito escura à noite.

Para obedecer aos padrões da ciclovia, Fureso já testou uma iluminação gerada por energia solar.

– As pessoas ficaram muito felizes com isso – afirma o líder do projeto climático do município, Lene Hartmann.

Há vários anos, uma moradora de Fureso, Karsten Hansen, deu início a um “ônibus de bicicleta”: os ciclistas viajam juntos, fazendo revezamento para bloquear o vento e facilitar a pedalada.

Hansen, que estima poupar pessoalmente uma tonelada de CO2 por ano, espera que a superciclovia incentive mais pessoas a pedalar as magrelas.

O prefeito de Fureso, Ole Bondo Christensen, também anseia pelas melhorias que a novidade trará. Christensen não tem carro e pedala diariamente mais de seis quilômetros para trabalhar:

– É minha forma de espairecer. Às vezes, tenho novas ideias.

Até o fim do verão no Hemisfério Norte, depois que o resto da iluminação alimentada por painéis solares for instalado, o trecho de Fureso da estrada estará pronto para virar superciclovia.

Projeto custou R$ 1,6 milhão

A Região da Capital da Dinamarca – responsável por hospitais públicos e pelo desenvolvimento regional – destinou US$ 1,6 milhão ao projeto da superciclovia.

– Quando pensamos em hospitais públicos, examinamos com atenção como reduzir os custos – diz um conselheiro regional, Lars Gaardhoj, que tinha acabado de pegar os três filhos pequenos numa bicicleta decorada com elefantes.

Na Dinamarca, graças a medidas como a superciclovia, os trabalhadores escolhem as bicicletas por serem um meio de transporte mais rápido e conveniente.

– A questão não é os dinamarqueses serem mais ligados à ecologia – avalia Gil Penalosa, diretor executivo da 8-80 Cities, organização canadense que atua para tornar as cidades mais saudáveis.

Para Lars Gemzo, sócio da Gehl Architects, dentro de Copenhague pedalar já era a melhor opção para muitos tipos de viagens. Estatísticas dinamarquesas apontam que a cada 9,7 quilômetros pedalados, existe uma economia de 1,6kg de emissões de dióxido de carbono e US$ 0,09 em custos de saúde pública. No entanto, muitos apontam a felicidade como um dos principais benefícios de ir ao trabalho de bicicleta.

– Após pedalar por 30 minutos, você passa a se sentir melhor – assegura o ministro dos Transportes, Henrik Dam Kristensen, que apoia as superciclovias.

O chefe de comunicação da Federação Dinamarquesa de Ciclistas, Frits Bredal, alertou que as superciclovias não eram perfeitas. Segundo ele, seria ideal não existirem sinais vermelhos, além de haver pavimento perfeito, sem buracos e obstáculos.

Diversas inovações ciclísticas estão sendo testadas em Copenhague. Algumas, como suportes para os pés e tecnologia “onda verde”, temporizando os semáforos na hora do rush para se adequar aos ciclistas, já estão funcionando na superciclovia. Outras, como latas de lixo inclinadas para facilitar o acesso e pistas para “conversação”, nas quais duas pessoas podem pedalar lado a lado e falar, poderão ser vistas em trajetos de longa distância no futuro.

Zero Hora, Caderno Nosso Mundo Sustentável, 27/08/2012

Sunday, July 29, 2012

 

Marina Silva nas Olimpíadas


Marina disputou a eleição contra a presidenta Dilma, mas sua presença nas Olimpíadas só constrangeu o madeireiro Aldo Rebelo. Divergências políticas não empanam a grande homenagem dada ao Brasil no evento.



Tuesday, July 24, 2012

 

Alvorada voraz


Não há a razoabilidade sob qualquer aspecto arrancarmos crianças pobres de suas casas, jogá-las na caçamba de um caminhão e despejá-las na rua. A propriedade pode ser indenizada, mas o trauma vivido pelos pequenos e suas famílias é irrecuperável: esse desrespeito é uma tortura! A posse de um pedaço de terreno não justifica a coerção militar de uma comunidade, tal qual campo de concentração. Se isso tudo não é pisar nos Direitos Humanos, não sei mais o que é Humanidade.

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