Sunday, July 22, 2012

 

Prosperidade conjunta


 Kathrin Rosenfield*

A cidade de Amherst, Massachussets, onde me encontro neste momento, é chamada The Commonwealth of Amherst (Prosperidade Conjunta de Amherst). Ela tem 25 mil habitantes (mais ou menos o tamanho da Vila Assunção, da Tristeza e da Conceição juntos) e, para as decisões de administração e planejamento, 250 cidadãos são eleitos para apresentar projetos e votar como serão desenvolvidas as diferentes áreas. A cidade decide. Não é nem o prefeito, nem o secretário, nem o governador, nem o parlamento. São os delegados constituídos da cidade. Há críticas a essa atitude, e talvez muitas delas sejam justas. No entanto, é admirável que uma cidade possa não somente decidir, mas ter critérios para decidir. Agora penso em Porto Alegre, no bairro onde moro e pelo qual luto – uma luta muitas vezes inglória, sobretudo quando se trata do planejamento de médio e longo prazo...

O desenvolvimento é atropelado, sem planejamento, feito ao sabor de interesses e ideias desconjuntadas. Rapidamente eliminam-se os pulmões verdes da orla, que – em vez de ser reservada para o uso comum (Common Wealth) dos moradores atuais e futuros – já tem grandes partes loteadas para torres comerciais e residenciais. E como ficarão o trânsito e os serviços básicos (de escolas a centros médicos e hospitais)? Ninguém sabe muito bem como tudo isso irá funcionar num futuro próximo. É claro que pouco se pensa nos espaços culturais. Enquanto os prédios históricos do Centro são restaurados, os bairros perdem seus casarões – ou ainda, eles caem em abandono ou são cedidos para fins bizarros –, como acontece neste momento com os charmosos prédios do complexo arquitetônico localizado na Rua Landell de Moura, 430, no bairro Tristeza. Os moradores reivindicam há anos a transformação do local em centro cultural. Ações explícitas, racionalizadas e insistentes começaram em 2005! Havíamos sugerido que o governo se unisse com a iniciativa privada para criar uma ilha cultural necessária para o desenvolvimento saudável da Zona Sul, onde faltam cinemas de qualidade, livrarias e bibliotecas, teatros e salas para dança, salas de exposição e de conferência, cafés...

No entanto, fomos surpreendidos com a recente notícia de que esse mesmo local – que reivindicamos desde 2005 – será ocupado por nada menos que quatro entidades que não refletem nenhum dos desejos dos moradores: pelo Movimento Tradicionalista Gaúcho, pelo Instituto de Artes Cênicas do programa Galpões Culturais, por “um grupo da comunidade, que já está no local, mas que deverá apresentar um projeto de ações culturais e de manutenção do espaço” e... pela Superintendência de Serviços Penitenciários – conforme uma decisão tomada numa “audiência pública” para a qual nenhum morador e nenhuma das entidades de bairro foram chamados.

As perguntas que se colocam são sem fim: quando e onde foi realizada essa audiência e quem participou? Sob que base o lugar foi cedido para o MTG? O que a Susepe vai fazer lá? E por que os reiterados pedidos da população não tiveram nenhuma resposta? Se existia um movimento da comunidade desde 2005, por que ninguém foi chamado?

Mas a pergunta principal, a pergunta de princípio para qualquer planejamento urbanístico e cultural é: que critérios foram utilizados para que quatro atividades tão díspares fossem escolhidas para um espaço público? Um e-mail para o gabinete da Secretaria da Cultura (enviado no dia 13 de julho) ficou – como é quase sempre de praxe – sem resposta. As ideias, contribuições e reivindicações dos moradores são ignorados. Fica claro que, aqui, não se trata de “prosperar conjuntamente”!

*PROFESSORA DA UFRGS  -  Zero Hora, 22/07/2012, PÁG. 14

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